Quem Somos:

Somos usuários de drogas da América Latina. Somos pessoas que foram marginalizadas e discriminadas, mortas, prejudicadas sem necessidade, colocadas na prisão, descritas como pessoas do mal, estereotipadas como perigosas e desnecessárias. Chegou agora a hora de erguermos nossas vozes como cidadãos, estabelecer nossos direitos e reivindicar o direito de sermos nossos próprios porta-vozes.

domingo, 14 de outubro de 2012

NADA A NOSSO RESPEITO SEM A NOSSA PARTICIPAÇÃO

Manifesto das pessoas que usam drogas ilegais

Nós estamos entre os grupos mais difamados e demonizados da sociedade. A sociedade civil e o governo frequentemente negam nossos direitos e nossa dignidade simplesmente porque usamos drogas tornadas ilícitas.

Nós somos os drogados”, os “maconheiros” e os “craqueiros” da mídia.

Nós somos rotulados de “indignos perturbadores da ordem”, até por profissionais que nos prestam serviços.

Nós fomos duramente atingidos pelas epidemias de HIV/AIDS e de hepatite C.

Nós somos frequentemente encarcerados ou enviados compulsoriamente para centros de recuperação de baixa qualidade, em vez de termos acesso à prevenção e programas adequados.

Nós somos também a grande maioria das pessoas que usam drogas sem que isso nos cause maiores problemas e, portanto, não precisamos de nenhum tratamento para dependência.

Nós somos vítimas da opressão e da violação de direitos humanos, comuns nos países que travam uma “guerra às drogas”, que frequentemente se torna uma guerra contra as pessoas que usam drogas - particularmente contra os pobres.

Nós somos continuamente excluídos das decisões que afetam nossas vidas e as vidas de nossas irmãs e irmãos.

Nós somos seus filhos, filhas, pais, mães, irmãos e irmãs.

E nós temos os mesmos direitos humanos que qualquer outra pessoa.

Nós temos o direito de participar significativamente das tomadas de decisões sobre questões que afetam nossas vidas.

Nós temos o direito de tomar decisões fundamentadas sobre nossa saúde, incluindo o que fazemos ou não ao nosso corpo.

Nós temos uma experiência e conhecimento únicos, e temos um papel vital a desempenhar na definição de políticas de saúde, sociais, judiciais e de pesquisa que afetam nossas vidas.

Hoje, demandamos que nossa palavra seja ouvida.

Temos capacidade para educar e ser educados, criar e gerir organizações, administrar fundos, representar nossa comunidade, participar de comissões consultivas do governo e trabalhar em variadas tarefas.

Nós precisamos:

˃ ser tratados como iguais e respeitados por nosso conhecimento e trabalho, frequentemente voluntário, na abordagem dos problemas enfrentados pelas pessoas que usam drogas, incluindo HIV, hepatites virais, overdose e demais questões relacionadas à saúde, ao social e aos direitos humanos que afetam nossas vidas;

˃ receber financiamentos e recursos adequados para gerir nossas organizações e para nosso desenvolvimento profissional;

˃receber apoio  quando demonizados e atacados na mídia ou pela comunidade por causa do que consumimos;

˃ receber apoio na luta contra o medo, a vergonha e o estigma que nos privam de uma livre e plena participação social e acesso aos serviços de saúde de que necessitamos;

˃estar significativamente representados nas organizações que nos prestam serviços;

˃ ter garantida nossa devida participação em processos consultivos, assim como nas instituições onde se tomam decisões ou se elaboram políticas e estruturas de aconselhamento que tratam de questões que nos afetam; e

˃ ter garantida nossa devida participação nas pesquisas e levantamentos que envolvem a obtenção de estatísticas e de informações referentes às pessoas que usam drogas.

“A grande maioria das pessoas que usam drogas não tem problemas com esse consumo e, portanto, não necessitam tratamento para dependência."              Anônimo

Temos um papel importante a exercer na defesa de nossos direitos, saúde e bem-estar.

Nossas organizações:

˃ devem ser dirigidas, controladas e administradas por pessoas que usam ou usaram drogas tornadas ilícitas;

˃ estão frequentemente mais preparadas ou melhor situadas para assegurar que questões de saúde e sociais que dizem respeito às pessoas que usam drogas sejam corretamente encaminhadas;

˃ estão frequentemente mais preparadas ou melhor situadas para impedir que sejam tomadas decisões que possam impactar negativamente a vida das pessoas que usam drogas;

˃ devem ser reconhecidas e valorizadas como agentes fundamentais no debate e na formulação e aplicação de políticas e de programas relacionados ao uso de drogas;

˃ devem ser apoiadas e fortalecidas na condição de principais interessadas;

˃ devem ser tratadas com respeito nas parcerias e acordos com o governo e outras organizações;

˃ reafirmam seu compromisso com o movimento mais amplo de pessoas que usam drogas, no sentido de dar-lhes poder e de sua inclusão, independentemente do tipo de droga e da forma de consumo;

˃ promovem tolerância e uma cultura de participação, respeitando a diversidade de experiências, conhecimentos, habilidades e capacidades;

˃ necessitam dedicar especial atenção à inclusão significativa das mulheres que usam drogas, para assegurar que suas necessidades sejam atendidas;

˃ apoiam as estratégias de redução de danos, cientes de que não existe melhor corpo teórico e prático para lidar com o uso problemático ou indevido de drogas.

Trabalhamos, em suma, pela educação, saúde, liberdade, respeito e direitos humanos das pessoas que usam drogas tornadas ilícitas.

Através da ação coletiva, desafiaremos as opressivas leis, políticas e programas de drogas existentes e trabalharemos com o governo e as agências internacionais na formulação de políticas e programas baseados em evidências e bom senso, que respeitem nossos direitos e nossa dignidade, e protejam e promovam nossa saúde e bem-estar.

Solidarizamo-nos com nossos irmãos e irmãs de outros países que repetidas vezes são vítimas de graves violações de direitos humanos. Exigimos que nossos governos adotem políticas públicas pelo controle e regulamentação das drogas ilícitas em nossos países, de modo que nossa saúde e nossos direitos sejam respeitados, protegidos e promovidos, e termos garantida nossa devida participação em todas as decisões que afetam nossas vidas.

Não somos parte do problema, somos parte da solução!

Este manifesto foi elaborado por pessoas que usam drogas que participaram das consultas de um projeto visando ao maior envolvimento delas nas questões que lhes dizem respeito. O projeto foi desenvolvido pela Canadian HIV/AIDS Legal Network, junto com o Programa de Saúde Pública do Open Society Institute e o International HIV/AIDS Alliance. Baseia-se em um manifesto semelhante desenvolvido no Canadá (como parte de um trabalho realizado pela Canadian HIV/AIDS Legal Network, Vancouver Area Network of Drug Users – VANDU e CACTUS Montreal); foi endossado pela International Network of People Who Use Drugs – INPUD. Os participantes deste projeto manifestaram seu desejo de que as pessoas que usam drogas em todo o mundo venham a adotar esse manifesto ou usá-lo como base para criar o seu.

As opiniões expressas nesta publicação são de seus organizadores e não representam necessariamente as opiniões dos financiadores.

Apoio institucional: Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos (ABESUP), Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos – NEIP, Coletivo Antiproibicionista Cannabis Ativa (RN, Brasil), ESPOLEA (México), Red Argentina por los Derechos y Asistencia de los Usuarios de Drogas (RADAUD), Acción Técnica Social (ATS/Colômbia), PROLEGAL (Uruguai), Red Argentina de Usuarios de Drogas y Activistas (RARUS), Colectivo por una política integral hacia las drogas, AC (CUPIDH/México), Red Mexicana de Reducción de Daños (REDUMEX), Mama Coca (Colômbia), Intercambios Asociación Civil (Argentina), Núcleo de Estudos Avançados sobre Álcool e outras Drogas – NEAAD/CETAD, Observatório Baiano sobre Substâncias Psicoativas - CETAD Observa, Frente Nacional Drogas e Direitos Humanos – FNDDH, Conselho Federal de Serviço Social – CEFSS, Associação Soteropolitana de Usuários: em Defesa dos Direitos e da Dignidade da Pessoa que Usa Drogas, Associação Brasileira de Saúde Mental (ABRASME), Estudiantes por uma Politica Sensata de Drogas (EPSD), Grupo Candango de Criminologia-GCCRIM, Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos-RJ e BA, Coletivo Antiproibicionista Princípio Ativo (RS, Brasil), Centro de Convivência É de Lei (SP, Brasil), Asociación Civil Centro de Estudios de la Cultura Cannabica(CECCa/Argentina), Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas - CETAD/UFBA, Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre Psicoativos - GIESP/FFCH/UFBA

Apoio: International Network of People who Use Drugs - INPUD, Psicotropicus/GDPP/LAP/Open Society Foundations, Universidade Federal da Bahia

© 2008 Canadian HIV/AIDS Legal Network, International HIV/AIDS Alliance, Open Society Institute and International Network of People Who Use Drugs (versão original); © 2012 Psicotropicus (versão em português e espanhol)

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